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Mostrando postagens de abril, 2013

Joana e o mar

Numa bela manhã outonal ela saiu para caminhar na beira do mar. Joana estava inspirada belo brilho do sol nas águas, pela quase ausência de pessoas e deslumbrada pela calmaria. Avistou de longe uma tartaruga marinha. Apressou o passo para ver de perto o magnífico animal. Chegando perto, notou o sangue na boca do bicho. Olhos sem vida, moscas. Estava morta a tartaruga numa bela manhã de outono.

Luto

Ideias também têm seu luto. Naquela semana o escritor sabia bem o que isso queria dizer. E na ausência de recursos líricos, prosaicos ou verborrágico, entrou em batalha mortal com seu papel. Uma luta sem vencedores, onde o luto de silêncio sepulcral prevaleceu.

Um bebê

"Luz de LED. Não sei o que é isso mas é bonita. Azul. Ela fica ainda mais bonita quando a mamãe desliga as luzes do quarto. Mas eu sei o que essa luminária de anjinho significa. Ela vai me fazer dormir. Todo dia é isso. Oba, vou ganhar mamá. Me pega no colo, me pega no colo! Ah, a mamãe sabe do que eu gosto. Sempre advinha meus pensamentos. Que engraçado, a luz vai e vem. Vai e vem. Podia ter um agito a mais aqui. Mãe, faz assim ó. Chacoalha, chacoalha. Ela é tão bonita olhando de baixo para cima. Sua boca, seu sorriso, seu carinho olhando para mim. Assim eu não consigo dormir, mamãe. Mamãe, cante para mim. Cante todas as canções de ninar que eu gosto. Agora me deite e me dê mais mamá. Obrigada, mamãe. Fique aqui comigo até eu pegar no sono. Olha mãe, venha ver esse brinquedo. Não pode. Não é hora. Então, tá. Me embala de novo, mãe. Espera. Agora quero ir lá no seu quarto ver o papai. Venha comigo, mamãe. Ah, mãe. Não quero dormir. Me põe no chão. Ah, chorar não convence v

Oniríco

Por que a gente não lembra direito dos sonhos? Deveríamos ter memória fotográfica e lembrar. Principalmente quando o que se sonha, parece cena de filme. Joaquim adorava sonhar. Na noite passada ele contou um sonho pitoresco. Estava passeando às margens de um rio, próximo de uma grade ponte pênsil que separava os bairros da cidade. Decidiu chegar mais perto das grandes pedras para andar sobre elas. Lá chegando encontrou um grupo de pessoas com roupas estranhas, praticando o que julgou ser uma espécie de arte marcial. Era algo como os katas do karate ou do kung-fu. Mas seus adeptos vestiam engraçadas roupas pretas com roxo metalizado. Ninjas? Talvez. Além do corpo traziam armas de corte e de fogo. Como um disparo de míssil foi exatamente fogo que saiu das mãos de uma das praticantes diretamente na direção dele. Joaquim caiu no rio e acordou imediatamente e passou o resto do dia impressionado com o sonho.

Todo dia

Dizem que o travesseiro é o melhor conselheiro. Não para Maria. Para ela o melhor amigo é o chuveiro. Ele é capaz de mandar pelo ralo suas aflições. Ele acalma suas angustias com uma envolvente massagem nas costas e água quente sob os pés. É incrível como grandes soluções nascem em seus encontros diários. Com ele, Maria é extremamente eloquente, articulada. Profere palestras mentais magnificas. Encontra o sentido da vida. Mas como numa mágica triste, ao fechar a torneira, secam suas ideias. E sair do box é atravessar um portal rumo à dura rotina da vida real

Tic tac

O despertador não espera. Nunca pode dar cinco minutos a mais. Não silencia. Aliás, há um jeito de ele calar a matraca. No tapa. E assim, todas as manhãs, o velho relógio de corda desperta seu dono. O ingrato faz o pobre diabo voar longe. Até que ele bate na parede se espatifa no chão. Como se ele tivesse culpa das noites de insônia ou de bebedeira. Como se fosse ele a dormir tarde. Ora essa, é seu trabalho afinal. Mas deixe estar, ele é forte. Uma relíquia de família que pertencera à vó do infeliz e que partir de amanhã irá fazer greve. E assim, desligou seus mecanismos e caiu em profundo sono, dando uma merecida lição a seu dono.

Para boi dormir

Era uma vez, um bezerro chamado Barnabé. Ele vivia em uma linda fazenda com muitos animais. Todas as noites sua família se recolhia no paiol, junto ao feno macio para dormir. Todos, menos ele. Inquieto, o bezerro Barnabé queria ir brincar com os vagalumes. Sua mãe, uma mimosa vaca malhada cantarolava sem sucesso. Seu tio Parrudo, um touro de rodeio aposentado, teve uma ideia. – Ei, guri. Venha aqui do muuuuu lado. Vamuuuus conversar. Tenho muuuuuuitas histórias para contar. Certamente, vão ajudar você a dormuuur. Interessado e desconfiado ao mesmo tempo, Barnabé se aconchegou bem perto do tio. – Vai muuu contar sobre o grande rodeio, tio? – Hoje não, garoto. Vamuuuuus devagar. Havia muitas histórias sobre o grande rodeio, mas o tio nunca falava sobre elas. Interessado, Barnabé parou para ouvir. – Nos muus tempos de guri, ninguém dormia dentro do paiol. Na chuva, no frio ou no calor, a boiada dormia amontoada. Era um grudado no outro. E sabe por quê? Para se proteger do

Conto como música

Adelaide, Adelaide, teu nome é um lamento. Uma lagrima no vento. Um pesar do coração.  Música triste, Adelaide, Adelaide. Ai de mim, que não sou santo, sou só um homem com saudades de ti. Ai, Adelaide. Ai Adelaide. Que um dia partiu e me partiu em mil. Ai de ti, ai de mim, Adelaide.

Um gato de fé

Há quem não goste de gatos. Isabella acha que são pessoas sem imaginação, sem infância. Para ela, os gatos são as criaturas mágicas mais próximas dos homens. Ela conta que para ter um gato, é preciso ter fé. É preciso acreditar na magia que os bichanos trazem. “Que outro animal de sete vidas?” Esse é um de seus argumentos favoritos em defesa de seus gatos. Ela jura que se comunica com eles por telepatia. Ou sei lá. Pode ser a expressão que facial deles. Isabella sempre amou gatos e acha que são injustiçados. “Eles têm mais o que fazer do que babar e lamber os donos, como os cães. Aliás, gatos não têm donos. Eles são parte da família.” Para mim, que vejo isso de longe, gatos são meio místicos, meio guardiões. São vários num mesmo. Ora discretos, ora escandalosos. Ora hostis, ora carinhosos. Talvez Isabella tenha mesmo razão. Quem tem fé, tem gato.

O resgate

Há muitos anos Breno deixou de acreditar em Deus. As injustiças, as fatalidades e os abismos sociais foram os motivos, alegava ele. Mas o mundo da voltas e hoje, sua fé está, novamente, sendo testada. Era a primeira vez que visitava o bairro mais pobre da cidade. Todas as ruas eram de terra batida. Ironicamente tinham nome de flores. Quanto mais avançava adentro, mais barracos de madeira surgiam. Algumas crianças brincavam descalças. Algumas mães estendiam roupas em varais de fio. E alguns homens o observavam. Ao chegar ao pé de uma rua íngreme, teve a subida interrompida por um homem de feições nada amigáveis. – Dê meia volta, disse ele. – A partir deste ponto precisa ter autorização para subir. – Sou Breno, irmão de Nelson. Vim buscá-lo. – Ouvi falar de você. O ex-padre veio buscar o maninho. Pode passar, sem batina. A tensão começou a tomar conta de Breno novamente. Não gostava de encarar seu passado. Deus estaria pregando uma peça nele? Engatou a primeira marcha e avan

Quero tempo, não prazo

O cursor sobre a tela em branco marca as batidas do coração. O relógio corre em seu próprio compasso, como um alienado do mundo. Estevão procura um gancho para sua escrita. Um tema, um assunto, um sinal divino. Nada. O cursor continua a pulsar a sua frente. Rindo e debochando de sua limitação. Estevão para. Fecha o notebook e vai para cozinha tomar um café. Ah… o aroma da bebida quente percorre todo seu corpo. Revigorado já não sente vontade de escrever. Não por hoje. Não agora. Deu-se folga. E contaminado pela euforia da cafeína, sai para uma caminhada. Seu editor liga desesperado. Pouco importa agora. O escritor quer tempo, não quer prazo.

Vida de anjo

“Como esvaziar um coração ansioso e neurótico?” Ana era um prato cheio para psicanalistas, mas embora quisesse não poderia bancar as sessões. Na tentativa de extravasar suas angústias, já não chorava. Não conseguia por mais que tentasse. Para fazer suas dores correrem de seu corpo, Ana sangrava. Não doía. Pelo menos fisicamente era mais suportável aguentar suas estocadas do que sustentar a fachada emocional. Não tinha tendências suicidas, muito pelo contrário adorava a vida. Só não podia aguentar algumas culpas. E para não chamar atenção, fazia cortes em locais imperceptíveis. Ninguém sabia. Ninguém entenderia. Seu segredo era sua escapatória. Seu pecado, era querer viver como os anjos.

Sete anos de azar

O dia começou mal para Sofia. Enquanto se maquiava para ir trabalhar deixou seu pequeno espelho cair da pia. O objeto se quebrou em vários pedaços e ela não teria tempo de arrumar das coisas. Acabara de ser contratada como vendedora em uma famosa e exigente rede de cosméticos. Seu objetivo era fazer faculdade de Letras, adorava as palavras. Para ela, a verdadeira beleza estava oculta por baixo das peles perfeitas. A essência da beleza está nas palavras. – Ai, que droga. Será que terei azar? O vestibular é amanhã – Pensou logo após quebrar o espelho. Apesar de não ser supersticiosa ficou apreensiva. O expediente transcorreu normalmente.  Na manhã seguinte, no horário certo estava ela pronta para fazer a prova. Quando o relógio marcou metade do tempo, Sofia preenchia tranquilamente o cartão-resposta quando algo terrível aconteceu: sua caneta explodiu em cima do documento. Desesperada, ela pediu ajuda aos fiscais, que indiferentes, informaram que sua prova estava perdida.

Descobertas da vida 3

Tiago adorava a natureza. As coisas mais simples, para ele, eram as mais belas. Quando tocou, pela primeira vez, numa plantinha sensitiva, ficou maravilhado em ver suas pequenas folhas se fecharem. Curioso, adorava estudar insetos. Borboletas, abelhas, joaninhas, formigas, etc. Mas havia um tipo que ele nunca vira: vagalumes. Procurava pelos pequenos voadores de luz própria, sem sucesso. Um dia, ao entardecer seu pai o levou para um passeio num terreno baldio, próximo de sua casa. – Aqui só tem moscas, pai. Retrucou. – Calma, menino. Espere o por do sol. Ele esperou. Então, quando os últimos raios de sol de apagaram, luzinhas começaram a piscar perto dos arbustos. O menino boquiaberto, enfim, viu os vagalumes. Depois de muito tempo conseguiu dizer. – Fadas, pai. Veja as fadas! Quando chegam os vagalumes?

Descobertas da vida 2

– Vó, faz pipoca? Bruno adorava comer petiscos na casa da avó. Principalmente, pipoca. Tão rápido de fazer. Ele já sabia que em dois minutos e meio no micro-ondas e o pacote estava no ponto. – Faço, sim, querido. Mas hoje venha me ajudar – respondeu a avó. Ao chegar na cozinha, o menino se depara com um saquinho de plástico cheio de sementes de milho. – Vó, vamos fazer tudo isso? Acho que esse saco derrete no micro, Vó. – Hoje vamos cozinhar à moda antiga, meu querido. Sem entender nada, admirou-se de ver a avó colocar óleo numa panela e adicionar uma xícara de grãos. Logo, o som dos primeiros estouros do milho saltando na tampa chamaram a atenção do menino. Quando os estouros começaram a soar abafados, a avó abriu a tampa. Para Bruno era um universo branco e cheiroso a ondular com os últimos grãos a pular. – Vó, eu não fazia ideia de que a cozinha dos antigos era assim tão linda.

Descobertas da vida 1

Desde que a Internet se popularizou no Brasil, as crianças que têm acesso a ela parecem saber de tudo. Orgulhosas de encontrar as respostas que precisam nos sites de busca, acabam sentindo-se onipotentes. Mas criança é criança. Hoje, em pleno século 21 ou em tempos longínquos sempre há algo novo a descobrir. Isso aconteceu recentemente com Isabela. Menina meiga, 11 anos que adora passar as tarde nas redes sociais. Numa tarde apresentava seu site favorito a uma amiga de sua avó. A senhora apreciou a novidade e a comparou com uma espécie de televisão misturada com videogame. A menina riu do olhar de surpresa da senhora. – Sabe, Isabela – disse enfim à menina – quando eu era da sua idade as famílias se reuniam em frente ao rádio para ouvir notícias e a radionovela. Era mágico imaginar o rosto de nossos artistas favoritos. – Um rádio para a família toda?! Como vocês conseguiam dona Maria? Com um dar de ombros, continuou. – Só mais tarde, bem mais tarde veio a televisão. E as i

Febre crepuscular

O anoitecer era o momento do dia favorito de Iara. Enquanto o sol se escondia atrás dos montes e as primeiras estrelas apareciam do outro lado do céu, ela contemplava o degradê da imensidão azul. Gostava da sensação de torpor que aquela hora a fazia sentir. Era como se seu corpo todo adormecesse, junto com o poente. Ela até inventou um nome para essa sensação: febre crepuscular. Quando o último raio de luz se apagava, Iara saía de seu transe e, como se nada tivesse acontecido, voltava a nadar e a encantar pescadores distraídos. A sereia do rio tinha inveja daqueles que tinham pernas e podiam sair mundo a fora. Ela tinha o sonho de escalar montanhas, só para ver onde o sol se escondia durante a noite e onde a lua dormia durante o dia. Sonho impossível para ela. Devaneio, diziam-lhe os peixes. Seus dias eram longos demais. O único instante em que ela esquecia de sua obsessão pela terra firme era durante o crepúsculo. Aquele era o seu instante de paz.

Pequeno rebelde

Pedrinho era um menino esperto, curioso. No auge dos seu 7 anos de idade começava a experimentar a paciência dos adultos e a testar seus limites. Estava levando sua mãe e sua professora à loucura com os palavrões que dizia. Repreende-lo parecia não funcionar mais. Uma tarde, na casa de sua tia, cada frase do garoto vinha enfeitada por um palavrão. Diante de tantos "nomes feios" a tia do menino teve uma ideia: – Pedrinho, que tal um jogo? Vamos falar palavrão até cansar. Quem sabe assim você enjoa. As regras são: eu digo um, você diz outro. Não podemos repetir. O primeiro a desistir, perde. Aceita? Você começa. – Cocô, disse o garoto. – Bunda. – Merda. – Filho duma égua. – Cu. – Porra, disse a tia. Silêncio. – Vai Pedro, sua vez. Silencio. – Cocô, diz ele. O permitido, afinal, era algo chato. Pedro não se sentia um transgressor de regras. Não era desafiado, nem desafiava ninguém com sua costumeira desobediência. E o menino nem conhecia tantos palavrões as

Conto de falhas

Aprender pela experiência é algo natural. Tentativa e erro é bem comum. Quase todo mundo segue esse padrão. Mas existem pessoas que desenvolveram um método próprio de aprender. Tal como arquitetos do autoconhecimento, costumam planejar detalhadamente sua jornada em busca do novo. Traçam rotas mentais. Antecipam obstáculos e, logicamente, as maneiras de transpô-los. De alguma maneira conseguem manter tudo sob controle. Assim é Heitor. Médico brilhante, era o mais requisitado da pequena cidade onde vivia. Desde que decidira ingressar em medicina, planejou cada etapa de sua vida e o prazo para atingir suas metas. Acima de qualquer coisa, Heitor seguia seu plano à risca. Seu sucesso, entretanto era solitário. Previra de tudo em seu projeto de vida, menos pessoas para compartilhar sua glória. No dia seguinte, resolveu recomeçar. Mas por onde? Naquela noite, sonhou com sua mãe. Não se viam há mais de 3 anos. Heitor alegava não ter tempo. Precisa seguir sua meta de vida. A mãe, mesmo

Casamento arranjado

Casamentos arranjados não são nem um pouco parecidos com o que se vê em filmes ou em novelas. Há uma certa sutileza neste tipo de pacto. É algo tão discreto que nem os noivos se dão conta. Quando dão por si, já estão casados. Entre as famílias judias os pais, ou melhor, futuros sogros e sogras, aproximam dois jovens enquanto ainda são bem pequenos. Começa de maneira ingênua. Um dia ele vem brincar, no outro é a menina quem vai à casa do rapaz. Os dias passam. Os meses correm. Os anos finalmente acabam por transformar uma bela  amizade de infância em um amor forjado. Este quase foi o destino de Joseph. Quase, porque um revés da fortuna deixou sua família financeiramente quebrada. Conforme os recursos de seu pai iam se esvaindo, mais raras eram as visitas de Esther. Até que nunca mais ele soube dela. Só depois de adulto, ele se deu conta do arranjo. Só depois de adulto e já malicioso entendeu a malícia dos adultos. Seguiu em frente.

Romântica e sonhadora

Elisa era do tipo romântica. Sonhava acordada por onde passava. Não conhecia problemas, tampouco era mimada. Apenas acreditava que seu modo de ver a vida era único e feliz. Procurava solucionar seus problemas com muita calma e simpatia. Um de seus passatempos preferidos era imaginar a vida das pessoas que, como ela, iam e vinham de ônibus todos os dias. Quem seriam? Que histórias teriam vivido? Onde estavam indo? No seu caminho diário até o ponto, passava por uma casa de dois andares. Havia sempre uma janela com cortinas entreabertas. Elisa podia ver o que deveria ser uma escrivaninha. E pensava: quem é o morador ou a moradora deste quarto? Por que deixa a cortina entreaberta? Será que é para receber os primeiros raios de sol da manhã? Será que é uma criança com medo de escuro? Com o passar do tempo, em começou a dialogar com os ocupantes imaginários daquele quarto. Todos os dias, ao passar em frente dava bom dia, boa tarde. Deseja boa saúde, enviava mentalmente boas vibrações e

A história de uma música

Músico profissional há mais de 20 anos, Carlos Leica orgulhava-se dos shows que havia feito, dos grandes hits que compusera e dos grandes intérpretes que deram vida a suas músicas. Ultimamente Carlos andava ensaiando era a sua aposentaria. Trabalhava apenas por encomendas e, ainda assim, escolhia a dedo o que iria fazer. Estava se dando bem no ramo publicitário e já havia emplacado vários jingles de sucesso. Seu mais recente trabalho, contudo, talvez fosse a encomenda mais difícil que recebeu em toda sua vida musical. Teria que compor uma canção em homenagem a uma criança que prestes a nascer. O bebê em questão era sua primeira neta. A primogênita de sua filha única já tinha nome "Sophia Leica de Andrade". Carlos não sabia o que o incomodava mais, se o "ph" no nome da menina ou o "de Andrade" vindo do genro e incorporado ao nome da sua própria filha. Há dias que tentava sem sucesso escrever algo para o bebê. Sua filha e sua esposa já estavam ficand

Sorte no jogo, azar no amor

Quando chegou em casa no fim daquele dia chuvoso, Cristóvão só queria saber de um banho quente e de uma taça de vinho. Podia sentir o aroma do seu Cabernet Sauvignon favorito e o cheiro de amaciante em seu edredom recém-lavado. Agora sim, completamente relaxado, envolvido por seu acolhedor ambiente doméstico, começou a refletir sobre o dia que tivera e lamentava-se da sorte que o acompanhava. Foi tudo assim, tão por um triz. Como ele, um homem tão esperto e orgulhoso de sua inteligência, se havia deixado enganar por aqueles olhos, por aqueles lábios... por aquela lábia? Enquanto se autoquestionava bebericava seu vinho e esperava que o companheiro ácido, lhe desse as respostas. A bebida deixava lágrimas tensas em sua taça. Por um instante Cristóvão imaginou ter visto a letra inicial do nome de sua musa formando-se no vidro. Sentindo-se levemente entorpecido pela bebida, deixou passar essa impressão. "Uma vez basta", pensou, "duas, não". Não tardou para que el

Desafio

Para comemorar o Dia do Jornalista o Jornalirismos lançou pra si mesmo um desafio: escrever um conto por dia, durante um ano inteiro. Vale dividir por temas, fases da lua, mesclar histórias reais a viagens transcendentais da minha cabeça. E como o blog trata de prosa e verso, vou desenhar com palavras. Sem imagens. All type e nada mais. Voilà

Insônia

Na calada da noite a cidade busca refúgio nos sonhos daqueles que, adormecidos, não veem o tempo correr. No refúgio da noite, os insones buscam calados o tempo de sonhar. Nos sonhos da cidade, o tempo se cala e veloz, vela por aqueles que, assim como eu, não adormeceram.

Vaivém

O dia vai A noite vem O rio vai A maré vem O verão vai O outono vem A alegria vai A tristeza vem A vida é embalada pelo balanço do tempo. Canção de ninar a sussurrar no ouvido.